29 maio 2016

5. You Make Me Love You - Capítulo 31

Nostálgica


Belieber's POV
Congelada, estática, praticamente morta. Era exatamente assim que eu me sentia ou, pelo menos, sentia o meu corpo, que não parecia ter qualquer perspectiva de como reagir aos estímulos do meio naquele momento.

— Lucas?

A boca secou logo após pronunciar o seu nome como se o meu próprio organismo duvidasse da minha sanidade. Afinal, quem poderia dizer que aquilo não era só uma ilusão causada pelo cansaço e estresse?

Apertei os olhos com força. Uma péssima ideia ao considerar que eles já começavam a se inundar de lágrimas, mas era um fator que eu não havia percebido até o presente momento quando finalmente notei que não era nenhuma bobagem da minha cabeça. Estava acontecendo e a imagem de uma Manuela satisfeita encostada à bancada da cozinha deixava isso bastante claro.

Um sorriso se abriu no rosto daquele bem diante de mim e eu corri para encerrar a distância que ainda existia entre nós – uma distância bem menor daquela que nos separava até pouco tempo atrás. Assim que ele abriu os braços para mim, todos os pelos do meu corpo se arrepiaram instantaneamente.

Eu estava em casa de novo.

Fazia mais de um ano que eu não via Lucas e, com certeza, um bom tempo desde a última vez que ouvira a sua voz, mas nada mudara. Talvez o corte de cabelo não estivesse mais o mesmo – aliás, estava muito mais bonito – ou as feições do seu rosto tivessem mudado um pouco mais. Mas era o mesmo perfume, o mesmo abraço, os mesmo olhos dissimulados de quem sempre tem uma carta na manga para qualquer situação.

Quando ele riu da minha reação, apertando-me mais forte sobre os seus braços, e eu percebi que era exatamente a mesma risada, toda minha estrutura corporal fraquejou. Senti como se precisasse do som daquele riso para me manter viva, porém não percebera isso até o presente momento. No máximo do egoísmo, quis guardar aquele homem em uma gaveta trancada para ele nunca mais poder ficar tão distante.

A máxima do “a saudades faz o amor aumentar” nunca foi tão verdadeira.

— Amor da minha vida — ele ainda falava comigo com exatamente o mesmo cuidado —, você não tem ideia do quanto eu estava com saudades de você!

— Ah, eu tenho, sim... — Ri, a voz totalmente embargada de uma considerável vontade de chorar.

Vale ressaltar que o meu emocional claramente não estava em ordem nos últimos dias. Qualquer fato irrelevante se tornava algo tão maior. Eu poderia chorar até mesmo se o zumbido de uma mosca atrapalhasse minha concentração. Mas o Lucas não era uma mosca – ainda bem, muitas garotas ficariam acabadas com isso — e chorar por ele era uma coisa que sempre valeria a pena.

Isso não significava, contudo, que ia me deixar desatar em um pranto de emoção com todas aquelas outras pessoas presentes na cozinha.

Aliás, por falar nelas...

— Vocês...

Soltei Lucas por um instante, girando o corpo lentamente para ver não só Manuela, mas Justin e Harry, que haviam seguido até a cozinha, segundos depois de mim. Finalmente, a minha ficha caiu!

— Vocês sabiam. — Arfei. — Vocês armaram para mim! Anda, confessem!

— O que você acha? — Manuela revirou os olhos, sorrindo, como se fosse óbvio demais até para uma pessoa tapada como eu.

— Que audácia! — Minha expressão se fechou em um biquinho de vergonha. — Isso não se faz...

Lucas havia deixado claro que só conseguiria chegar para o meu casamento em cima de hora, de forma que eu só o veria na cerimônia e não teríamos um tempo para ficar juntos. Aluno de medicina na faculdade mais conceituada do Brasil, ele ainda caminhava para o último período e começara a estagiar em um hospital particular para ter contato com a vivência do seu futuro dia-a-dia. Tempo também não era algo do qual ele dispunha muito.

Vê-lo ali, mesmo que tudo estivesse corrido, era tão reconfortante. Saber que a gente teria disponibilidade de curtir a companhia do outro, apesar de ser por um curto período, era o melhor presente de casamento que qualquer um poderia me dar. Mas eu esperava de verdade não ter que passar pelo constrangimento de me emocionar na frente dos meus amigos.

Era para isso que servia o casamento. Para eu chorar na frente de todos aqueles que conhecemos e, então, eles terem material para rir de mim posteriormente. Ou seja, eles poderiam esperar mais um pouco.

— Quer saber a melhor parte? — Manuela deu alguns passos na nossa direção, encostando levemente do braço de Lucas ao falar. — Adivinha de quem foi a ideia de não te contar nada?

Estreitei o olhar e arquei a sobrancelha ao fitar o loiro diante de mim.

— Não me olha assim. — A expressão do loiro era a mesma que ele usava quando alguma de suas “namoradas” o flagrava aprontando alguma coisa, depois de avisar que ele não era para namorar. — O que você esperava de mim?

— Você não muda, não é?

— Você gosta.

Seu sorriso cafajeste tilintou para mim e eu amoleci. Cheguei a abrir a boca para falar mais alguma coisa, mas, por alguns instantes, seu olhar se perdeu para algo que estava atrás de mim.  Me lembrei de Justin e Harry parados na porta da cozinha e eu soube que teria muito que conversar com o meu melhor amigo. Ele não iria pegar leve com as perguntas e eu... Eu não conseguia sequer responder a mim mesma.

Suspirei, incapaz de pensar nessa situação. Virei-me para a direção em que meu noivo se encontrara, pronta para repreendê-lo por não ter me contado sobre o que Lucas planejara. Obviamente, eu sabia que nada para eles – nem para mim – seria tão especial quanto a surpresa, mas se eu soubesse, as coisas seriam diferentes. Por exemplo, eu não precisaria ficar emburrada e nem ter me sentido rejeitada pelo meu próprio futuro marido.

Essas coisas são relevantes na vida de uma mulher.

Contudo, quando já me preparava para falar, observei Justin sutilmente dar as costas para a situação e retornar para a sala. Não sei por qual motivo exatamente isso me chamou atenção, mas algo em sua expressão não parecia bom. Me perguntei se Lucas, com sua gentileza digna de um elefante, já não teria feito com que ele se sentisse mal de alguma forma. Considerar isso não me deixou muito feliz, mas era possível.

— O que foi? — Harry me distraiu da apreensão ao começar a falar. — Nem adianta olhar para mim, eu só segui as coordenadas da Manuela. O plano era te tirar de casa e te trazer de volta em tal horário...

— Você é muito levado! — Soltei, tratando-o como criança, enquanto me aproximava.

Abracei-o devagar, achando toda aquela situação muito engraçada. Ao mesmo tempo, eu me sentia meio malvada e desorientada, mas, dessa vez, era em um bom sentido. Aliás, tudo parecia ir para o melhor dos significados possíveis quando Lucas estava por perto. Em certo ponto, participando de toda essa armação cara de pau, Harry ganhava tantos pontos comigo que dava até vontade de pedi-lo em casamento. Mas, por alguma razão, isso não parecia mais necessário.

Até porque, devido à situação que eu provocara lá embaixo, não tenho muita certeza se ele iria aceitar.

— Desculpa — sussurrei em seu ouvido, evitando que outros ficassem cientes da nossa privacidade. — Se eu soubesse, eu nunca teria te provocado desse jeito. Achei que teríamos tempo...

— Tudo bem. — Ele sussurrou de volta, em um tom ainda mais baixo do que o meu. — Eu tenho um pouco de culpa nisso também. Mas não pense que eu esqueci o que você falou sobre a lua de mel. Não se esqueça você também, porque eu vou querer tudo...

Segurei o riso e me afastei de seu abraço, trocando olhares que eram tão inapropriados que eu nem consigo expressar seus significados. Obviamente, eu não trocaria a chegada de Lucas por nada no mundo, mas a face de Harry realmente me fazia pensar que não seria tão ruim a gente ter enrolado só mais um pouco na garagem...

— Bom, por ora, ela é toda sua! — Falou, dirigindo-se a Lucas, enquanto me dava um beijo na testa. — Mas não abuse.

— É mais capaz de ela abusar de mim — ao lado de Manuela, Lucas respondeu sorrindo. — Vocês estão juntos há bastante tempo, acho que já ficou óbvio o quão preguiçosa ela pode ser...

— E folgada.

— Abusada.

Estava aberta a temporada de meter o pau na futura noiva. Olha, claramente, eu não era obrigada a me submeter àquelas gracinhas debaixo do meu próprio teto.

— Ok, gente, já entendi o amor de vocês por mim. — Interrompi, dramaticamente cruzando os braços. — Agora chega, né?

— Tudo bem — Harry suspirou, contendo um riso. — Boa sorte aí, cara!

Revirei os olhos para as palavras do moreno e ele riu. Dando-me a língua, se despediu, retornando até a sala de estar, onde imaginei que ele não ficaria por muito tempo, já que era consideravelmente tarde.

Por fim, restara naquela cozinha só eu, Lucas e Manuela, sozinhos. O quarteto fantástico de três pessoas. Que nostalgia!

Naquele momento, no entanto, eu estava em paz. Completa e serena. Ter Lucas ali era a melhor coisa que poderia acontecer. A aura dele me dava forças, de uma forma que ele não precisava fazer ou falar nada, só precisava estar ao meu lado e respirando. O mínimo de esforço que ele pudesse ter já era suficiente para transbordar o meu coração de todos os sentimentos bons que eu cultivava por aquele loiro.

Além disso, não era só a usual boa sensação que ele trazia. Era a saudade. Uma saudade que, no dia-a-dia, eu tinha que me obrigar a fingir que não existia, enquanto seguia na minha vida agitada. Só que ela era inerente a mim, tão radicalmente que mesmo Lucas estando ali, eu ainda a sentia. E, por mais que às vezes doesse, eu adorava saber que essa saudade tão intensa era uma parte inseparável de quem eu era. Era ela a responsável por não me deixar esquecer nunca o quanto eu amava esse homem e muito menos dos momentos que a gente passara junto.

Em um minuto, eu estava abraçando tanto Lucas quanto Manuela com toda a energia e força que eu ainda tinha no corpo – o que obviamente era tão parca que se tornava impossível de ser quantificada. Nós estávamos ali, nós três, como nos velhos tempos. Com todas as mudanças esmagadoras da vida e com um novo status de pessoas adultas, mas ainda éramos nós e eu queria gritar de felicidade.

— Acho que eu vou morrer de empolgação! — Disse, ainda no meio do abraço. — Ou, ao menos, desmaiar. Isso com certeza.

— Ei! — Manuela se pronunciou, parecendo ultrajada com o que eu dissera. — Esse papel é meu. Ponha-se no seu lugar.

Risos encheram a cozinha. Eu, porém, não ria por conta do que ela falara. Eu simplesmente não conseguia conter o tangível êxtase de estarmos ali, rindo e fazendo piada que faziam referências ao passado. Aquele era basicamente um daqueles momentos em que sua vida parece um episódio emocional do seu seriado cômico favorito. Meu riso vinha dessa percepção e do furacão de sentimentos que ela despertava.

— Lucas — interpelei, assim que consegui controlar minha alegria frouxa —, você está intimado a me contar cada mísero detalhe da sua vida. Se prepare, porque essa vai ser uma longa noite, eu quero falar de tudo.

— Bom... ­— Seu tom não parecia muito amigável às minhas vontades. — (Seu nome), você sabe que eu te amo e, olha, essa seria a coisa que eu mais apreciaria fazer. Mas, acho que você tem outros planos para hoje...

Franzi o cenho, contrariada. Dentro do meu conhecimento, o único plano que eu tinha feito para aquele dia envolviam sexo e Harry Styles, mas eu já o havia cancelado. É válido, ressaltar ainda, que não tinha como Lucas Barros estar ciente daquilo. Inclusive se tivesse alguma forma de isso chegar até ele, bom, eu já teria me matado muito antes que acontecesse.

— Na verdade, nós temos — Completou Manuela, dando ênfase ao pronome utilizado.

Precisei de um minuto para varrer minha memória, procurando algum momento em que eu tivesse marcado algo, porque geralmente não era de esquecer compromisso. Foi então que – mais uma vez de uma forma muito lenta — a minha ficha caiu e eu percebi o que estava acontecendo. Ou melhor, o que não ia acontecer.

Eu iria me casar em dois dias. Como poderia ser mais óbvio?

— Ela não fez isso... — Sibilei, fitando Lucas, já desesperada.

— Repito: É a Manuela. — Ele sorriu e eu pude sentir naquele sorriso vestígios de pena. — O que você esperava?

Pensei em pegar uma faca e enfiá-la algumas vezes dentro do meu cérebro para me convencer de que aquilo não estava acontecendo. Mas estava e eu tive que me contentar em virar devagar para Manuela e tentar matá-la com o meu olhar mais seco e cheio de ódio que eu conseguia imprimir.

— (Seu nome), nem adianta querer comer a minha cabeça — falou, sem mal olhar para mim, aparentando tanta tranquilidade que chegava a dar mais raiva.

— Por que você faria uma coisa dessas? — O mais chocante era eu estar incrédula ainda.

— Porque eu sou sua melhor amiga — defendeu. — Eu não podia deixar que você casasse, que sua vida de solteira se esvaísse assim sem que você tivesse a chance de presenciar caras lindos e gostosos seminus dançando na sua cara, enquanto bebe e ri com suas amigas.

— Olha, tirando a parte dos caras, ela tem um bom ponto — Lucas, como sempre, se intrometendo na hora errada. — Talvez você nunca volte a ser solteira de novo.

— Talvez? — Me indignei. — Qual o nível de credibilidade que você dá para o meu casamento, moço? Posso saber?

— Ei, calma aí! O seu problema é com ela...

Lucas tinha razão. Eu não conseguia imaginar o que Manuela tinha na cabeça ao organizar uma despedida de solteira bem debaixo do meu nariz. Não tinha nada a ver comigo. Mas esse comportamento "morde e assopra" tinha tudo a ver com aquela garota. Ela sabia que a chegada de Lucas iria me amolecer para qualquer coisa e estava usando disso a seu favor.

Dessa vez, eu não ia me deixar levar tão fácil.

— Manuela Magalhães — respirei fundo ao pronunciar seu nome —, eu quero que você me dê um bom, na verdade, um ótimo motivo para eu comprar essa sua ideia.

— Que tal esse: eu já chamei todas as suas amigas daqui e, inclusive, algumas já estão esperando por nós. Não seria constrangedor ter que cancelar tudo agora? — A forma como ela falava não transmitia muita segurança e ela sabia que eu percebia isso.

— Até aí o problema é seu! — Rebati. — Não me importo para o constrangimento.

— Ah, é? — Ela cruzou os braços, decidida. — E se eu te disser que não ter uma despedida de solteira dá azar para o casamento. Vai arriscar?

Meus olhos se esbugalharam de pânico.

— Lucas, isso é sério?

— Eu sei lá, acho que não. — O loiro deu de ombros, despreocupado. — Mas, sendo ou não, você vai acabar indo de qualquer forma.

— Ah, é? E por que eu faria isso?

— Porque a Manuela é sua melhor amiga, você a ama e é mais provável que um raio caia sobre mim agora do que você consiga dizer ‘não’ para ela...

Pude ouvir Manu soltar uma risadinha, claramente concordando com o que ele havia dito. Nesse momento, quis bater o meu pé e me recusar a sair de casa, só para provar para os dois que eles estavam errados.

Mas não estavam.

Inclusive, nenhum raio caiu sobre Lucas.

Sorte dele. Azar o meu.

— Eu odeio vocês! — Declarei, cruzando os braços.

— Se divirtam, meninas! — Ele riu, caminhando em direção à cozinha. — E, (Seu nome), não se preocupe, quando você voltar, vamos falar sobre tudo o que você quiser. Sem exceção, serei seu.

Eu sabia que Lucas estava falando aquilo como forma de apaziguar a situação, até mesmo o fato de ele ter basicamente entregado minha vida nas mãos de Manuela, ao expor minha dificuldade em dizer “não”. Mesmo assim, não consegui deixar de ficar feliz com isso, em pensar que ele “seria meu” como há tanto tempo não era.

Assim, quando me virei para encarar Manuela com uma expressão bem má, eu já estava completamente dócil por dentro, o que não me deixou ter tanto sucesso. Mas o que eu poderia fazer? Era Lucas. E era Manuela. Eles poderiam fazer as maiores loucuras do mundo e teriam a total liberdade de me incluir nelas, porque retinham anos e anos do meu amor e entrega.

Decidi que iria levar os planos de Manuela de forma leve, sem fazer birra.


Só que, quando encontrei seus olhos novamente e ela sorriu de forma suspeita para mim, eu vacilei. Precisava de muito pouco para eu conseguir ler em sua forma de se expressar que seria uma longa noite, em que tudo podia e ia dar muito errado. A pior parte... É que eu sentia que ia gostar.

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Migas,  capítulo 31 aí direto para o coração de vocês.
Capítulo levinho, sem muitas delongas, mas muita nostalgia.
Espero do fundo do coração que vocês gostem, porque o menino mais safado e fofo do mundo está de volta nessa fic e ele não é do tipo que deixa as coisas caírem na monotonia. Quem gostou de ver o Lucas de volta?

Se vocês gostaram do capítulo, me contem. Críticas, pedidos e sugestões são muito bem vindos. Comentem! :)

Um beijo no core de cada uma...


14 maio 2016

5. You Make Me Love You - Capítulo 30

E se eu não amar?


Belieber's POV
     Sabe quando você, em seu doce e quase único momento de privacidade do dia denominado banho, se utiliza de todos os artifícios já inventados pela indústria dos cosméticos para gentilmente esfolar sua pele fora? Bom, bem-vindo ao meu mundo!

O sol já estava se pondo enquanto eu me arrumava para sair com Harry. Fazia muito tempo que a gente não tinha um momento sozinhos e, em partes, eu até que sentia falta de fazer os programas, de ter as conversas, de dar as melhores risadas e curtir aquele apego de casal que dá o gostinho de bolo de chocolate a uma relação a dois. Porém, naquele dia em especial, eu parecia estar de dieta.

Estava com um humor de ficar em casa enroladinha no cobertor comendo besteira a tarde toda (a dieta era realmente metafórica), como se tivesse chovendo dentro de mim. Mas não estava. Minha consciência se encontrava – quase – tranquila, porém sem qualquer vestígio de paciência e animação para, sei lá, sair em público. Sair. Existir como ser humano.

Só que não era a isso que se resumia o meu banho esfoliante. Não, não era tão fácil assim; ele ia além. Ele quebrava barreiras e eu, rebelde, parecia querer quebrar qualquer sinal de queratina em minha pele.

Tudo bem, vamos só encarar a realidade. Minha consciência parecia ter o peso de um elefante se equilibrando em um fio de macarrão ainda cru. E o pior... O safado do macarrão não tinha a audácia de se quebrar para fazer o elefante cair logo de uma vez.

Nossa, eu tenho a mentalidade uma criança de sete anos, o que, pelo menos quer dizer que eu tenho alguma mentalidade, porque ética eu devo ter deixado na barriga da minha mãe. Por isso que nasci chorando.

Nietzsche, sábio como ele só, falava sobre a morte da metafísica. Bem, eu falo da morte da minha integridade e dignidade como ser humano. O funeral da pobre coitada acontecia naquele exato momento, enquanto eu tomava banho e, depois, enquanto eu me vestia e até mesmo ao descer as escadas para encontrar um Harry completamente arrumadinho e com um lindo sorriso no rosto. Sim, eu tivera a cara de pau de conseguir ficar pensando na noite passada com Justin durante todo esse tempo – e no resto do dia também, é claro.

Por dentro, é claro, eu me sentia uma traidora, mesmo que isso não fizesse qualquer sentido, porque a traição física – aquela super valorizada –, eu já havia cometido há alguns dias atrás, sendo totalmente coagida, mas não era só isso. Minha definição de traição estava justamente no sentimento que florescia sempre que eu pensara em todo o tempo que estivera com Justin, brincando e sendo uma boba.

Por fora, contudo, eu sabia que estava aparentando uma incomum serenidade.

Vale a nota: não era serenidade, era dormência emocional e física. Tecla SAP: estava praticamente dopada de uma droga perigosíssima chamada “pensar demais”. Não recomendada em caso de você querer ter uma vida saudável e feliz.

— E aí? — Harry encheu a sala com o som da sua voz ao me ver descendo as escadas. — Tudo pronto para irmos?
— Hã... Claro! — Esbocei um sorriso, enquanto chacoalhava a cabeça, tentando afastar as preocupações que já deveriam ter me largado há um bom tempo. — Vou só pegar umas balinhas na cozinha. Nós vamos no meu carro?
— Bom, a gente está na sua casa. Você tem outro?
— Ok, pergunta idiota. — Harry claramente não sabia, mas, quando você é noivo de alguém, a vida diz que você não pode tratar as perguntas do seu companheiro como idiotas, mesmo que, sim, elas sejam totalmente sem propósito. — Você viu a Manuela e o Justin? O que eles estão fazendo o quê?
— Eu não sei bem — respondeu, me seguindo até a cozinha. — Eles subiram há algum tempo e a Manuela estava surtando por conta de algo que viu no celular. Deve ser o Ryan...
— Provável. — Suspirei, ignorando a leve mordida da curiosidade.

Após pegar minhas pastilhas de açúcar e felicidade, me pus em direção a saída do cômodo, sabendo que Harry estaria bem atrás de mim, seguindo o caminho até a garagem da casa. Mas, para variar, deixar meu inconsequente noivo longe da minha visão não era uma ideia muito boa.

De súbito, Harry me agarrou por trás, quando eu já estava atravessando a porta que dava novamente para a sala. Sem qualquer coordenação, cambaleei sobre o meu próprio peso, sendo firmada pelos mesmos braços que provocaram tal reação. Uma risada quentinha tilintou nos meus ouvidos e não pude evitar que meu coração, ingênuo como ele só, pulasse sutilmente como resposta.

Suavemente, Harry me fez rodopiar como um passo de dança e me segurou ainda mais forte e ainda mais perto. Seu rosto estava pálido, mas continuava sendo quase mortífero de tão agradável e, com aquele sorriso, se tornava também reconfortante. Eu estava començando a ficar tonta e isso não tinha nada a ver com o fato de ter girado muito depressa.

Minha cabeça estivera tão pilhada com pessoas alheias ao meu convívio mais próximo – leia-se: Justin –, que eu quase conseguira me esquecer do quanto eu gostava de estar perto de Harry. E eu gostava mesmo, bastante.

“Mas isso tudo não vai rudemente de encontro ao seu pensamento da noite anterior, de não se fechar no que já conhecia, no buraco do confortável, bonita?”, o meu lado que nunca conseguia simplesmente ficar de boa pareceu berrar na minha cabeça, justo quando eu começara a sorrir.

— Eu já estava com saudade de ficar só com você... — Ele sussurrou, bem perto do meu rosto, me fazendo, surpreendentemente àquela altura do campeonato, ficar tão corada quanto possível.
— Eu também — respondi, por reflexo, já sentindo a neura que eu mesma me impusera.

Seguindo o contexto do nosso raro momento a sós, Harry apertou suas mãos em mim e colou seus lábios nos meus, repetidas vezes, me fazendo rir, antes de finalmente me beijar com vontade. Por um segundo, desejei ter ficado apenas nos selinhos inocentes. Eram bons, sutis e não tinham o efeito de me fazer sentir como se tivesse passando por uma morte cerebral, como aquele beijo, naquele momento, fazia.

A noite passada retornara a cair sobre a minha cabeça, agora com o peso de uma enorme bigorna.

Na verdade, a pior parte dela – antes da conversa franca, antes de nos divertirmos tranquilamente. Aquele contato físico me estapeava profundamente a cada segundo e, mais do que isso, o desejo que senti naquela hora parecia um martírio. Que sensação horrível essa!

Ao se afastar de mim, Harry tinha seus olhos de uma doçura infinita brilhando sobre os meus. Chorei em silêncio, ao conseguir me enquadrar no rótulo de pessoa mais sem coração que já passara na Terra dentro de seus históricos bilhões de anos e, de uma forma conjunta, a pessoa mais dramática também. Eu devia ser atriz ao invés de cantora.

Mas naquele caso era diferente. Simplesmente não dava para explicar o poder opressor de quando meu adorável noivo abria o maior dos sorrisos ao me olhar. Nossa Senhora da falta de vergonha na cara, por que justo eu?

— (Seu nome) — ele pareceu meio desesperado ao falar, o que me assustou bastante. — Vamos logo embora antes que a gente acabe ficando em casa...

Ri, incentivada por seu jeito que parecia nunca mudar e me levava de volta à posição de me sentir reconfortada. Além disso, era aquela forma de se portar que ainda me deixava atada a seus dedos, mesmo naquela situação constrangedora em que eu quase respondi para que, por favor (mas, por favor mesmo!), pudéssemos ficar em casa. Acho que nada no mundo me faria mais feliz.

...

Tudo bem, é mentira. Havia muita coisa que me faria mais feliz, sim, como, por exemplo, conseguir fingir que nada com Justin havia acontecido. Ou melhor, se realmente nada tivesse acontecido. Ok, (Seu nome), não sejamos extremistas. Para ser sincera, acho que eu não estaria tão feliz assim se aquilo não tivesse ocorrido.

E lá vou eu me afundando de novo no poço da vergonha — ou  da falta dela. Mãe, por favor, me perdoa, eu sei que você não me criou para isso, mas essa coisa de viver é muito mais difícil do que eu pensei.

Enquanto tinha uma breve discussão imaginária com a minha saudosa mãe, eu e Harry fomos até a garagem e deixamos a casa, em uma velocidade alta demais para que eu tivesse coragem de conferir. Por um minuto, no entanto, desejei estarmos rápidos o suficiente para deixar todo o meu lado insano em alguma esquina qualquer. 

— Então — em um impulso, decidi, por mim mesma, que iria só tentar ficar tranquila, sem pensar demais, sem repressão imaginária na minha cabeça —, animado para o jogo? Faz tempo que a gente não faz isso, não é mesmo?

— Isso o quê? Sairmos juntos e sozinhos para um programa realmente empolgante como todos os casais costumam fazer? Realmente faz muito tempo que não fazemos isso — seu tom sarcástico dava o ar da brincadeira ao mesmo tempo em que fazia com que minha cara fosse no chão, tamanho constrangimento.

— Não, idiota! — Respondi, mostrando-lhe a língua. — Você sabe que eu estou falando dos jogos da liga, não banque o palhaço. Você magoa meu pobre coração, sabia? Você devia lembrar que é...

— Complicado, eu sei, amor da minha vida. Eu só estou brincando. — Seu sorriso calmo suavizou os ânimos da conversação e ele me lançou um olhar de canto. — Só seria muito bom mesmo que você prometesse, se puder, que apesar do quão louca possa ser nossas vidas daqui para frente, não vamos nunca nos fixar no comodismo do casamento... Pode prometer isso?

Respirei fundo, tropeçando no erro mais cedo do que pensava. Lá estava eu refletindo sobre algo que deveria ser óbvio.

Na verdade, por toda a minha vida, esse foi um medo bastante real. Relacionamentos e, ainda mais quando eles tomavam uma proporção de compromisso tão grande como o casamento, de uma forma ou outra, estavam fadados pelo menos na minha cabeça ao comodismo, à mesmice, que era uma coisa que, por mais segura que fosse, eu me recusava a enfrentar.

É sério que as pessoas acham que é normal você encontrar o suposto amor da sua vida e aceitar que, dali em diante, o propósito da sua existência é ser um banana que faz o mesmo sempre?

Pessimista, eu sei. Mas eu me acostumei a pensar assim durante muito tempo, sem que ninguém fosse capaz de me provar que as coisas não iam sempre por esse lado.

Essa era só mais uma das milhares de coisas que Harry e eu concordávamos sobre. Ele era agitado, quase hiperativo e eu, inconstante, quase uma conta de celular no final do mês. Surpreendentemente, a gente se dava bem assim e até nos encaixávamos nas nossas pequenas loucuras do dia-a-dia. Eu sabia que, com ele ao meu lado, não corria o risco de ficar entediada, pelo menos não em um limite imaginável de dez anos. 

Só que não era esse o problema.

Falar do casamento em si estava me deixando apreensiva. Há algumas semanas atrás parecia tudo tão certo e, agora, era só um castelo de areia esperando uma onda bem forte vir derrubar. Mas Harry não tinha como imaginar isso. Pelo menos, era o que eu, afundada na minha própria ingenuidade, achava.

— Prometo — sorri, meio sem jeito.

Segurei o suspiro que surgiu logo em seguida, tentando não deixar o clima pesar demais. Eu não queria que o nosso passeio se estragasse com problemas que, por mais que me perseguissem, eu abominava. Eu tinha saído de casa, afinal, para não pensar, para entender o que estava sendo esfregado na minha cara o tempo todo: as coisas com Harry eram muito mais simples e aconteciam quase como se fosse uma brincadeira do acaso. Talvez, eu devesse me convencer de que a vida é exatamente sobre isso.

Não era necessário complicar tudo sempre com milhares de neuras que poderiam esperar até amanhã — e usualmente elas podiam mesmo. Mas não as de Harry. Pelo menos, não naquele momento.

E lá estava eu, melhor amiga da culpa novamente.

— (Seu nome) — Harry, retomando a palavra, suavizou o tom de voz como costumava fazer quando ficara triste —, eu estou te sentindo meio avoada ultimamente, sabia? Especialmente quando eu falo sobre o nosso casamento...
— Impressão sua — novamente, a resposta foi um reflexo.
— Está acontecendo alguma coisa? — Evitei olhar para ele e sua possível expressão de cachorrinho abandonado enquanto suas palavras se externavam. — Você não quer mais casar comigo?

Meu coração apertou quando eu entendi, de fato, o que ele tinha perguntado e, consequentemente, ao que eu estava submetendo aquele homem que sempre fora tão doce quanto possível comigo.

Eu havia passado os últimos quatro anos com Harry e tinham sido quatro anos muito satisfatórios, com notoriamente muito mais momentos bons do que ruins. Subitamente, então, ali acelerando naquele carro, ele estava descrente de algo que eu deixava claro ansiar por tanto, tanto tempo. Eu que havia feito uma turnê mundial inteira sentindo a mão nua e desprotegida sem o anel que costumava completá-la, agora esfregava a tortura da incerteza na face que eu sempre enchera de beijos.

Algo realmente não estava certo. Definitivamente não tinha nada a ver com Harry e, naquele momento, meu desejo mais profundo foi ser madura o suficiente para livrá-lo daquela confusão generalizada que eu estava causando em mim e ao meu redor...

Mas eu amava o Harry.

...

Mas eu também tinha medo de não amar. E se eu não amasse? Eu sabia não amar o Harry?

— Harry, por que você está dizendo uma coisa dessas? — Miei, melancólica.
— Eu não sei! — Respondeu, com os olhos tristes grudados no asfalto. — Talvez, você...
— Não! Não tem “talvez”! — Meu tom de voz se elevou quando eu comecei a negar aquilo até para mim mesma. — Harry, nunca teve um talvez e não vai ser agora que vai passar a ter. É sério que você conseguiu esquecer tudo o que a gente já passou e todos os milhares de planos que já estão feitos, os quais, eu não sei quanto a você, mas eu não quero abrir mão?

Eu estava me sentindo psicótica por dentro, como se fosse começar a chorar como uma criança mimada a qualquer momento. Parte de mim queria abrir a porta do carro e sair correndo para me livrar da minha própria pessoa; outra queria gritar, bater no Harry por ser tão idiota e havia ainda a que queria bater em mim mesma por ser tão... Ok, eu não sei se existe uma palavra no mundo capaz de descrever os cataclismos nos quais eu sempre me colocava. Talvez seja algo patológico mesmo. Que saudades de fazer terapia!

— Olha, me desculpa, tá bom? — Precisei respirar bem fundo, antes de pontuar em me desculpar. — Eu sei que eu devo estar dando um nó na sua cabeça nesses últimos dias, mas, se você quer saber, eu também estou dando um nó na minha também. Organizar um casamento e ser cordial com as pessoas não é nada fácil, mas...
— Mas eu te conheci assim, não foi? — Quando Harry me interrompeu, me deixando um pouco frustrada, sua expressão já havia mudado consideravelmente e um sorriso se desenhava em seu rosto. — E eu tenho quase certeza que foram os consecutivos nós que você deu na minha cabeça que fizeram com que eu me apaixonasse por você... Até porque acho que ninguém em sã consciência se apaixonaria, né, (Seu nome)? Reconheça!
— Ei! — Que ultraje!

Harry riu da minha reação, me lançando aquele olhar confuso que poderia tanto significar “eu estou brincando com você” quanto “quero transar”. Mas acho que, no final, todos os olhares de Harry poderiam realmente se confundir com o do sexo mesmo.

— Me desculpa, eu estou sendo um bobo, não é? — Ele voltou a se concentrar em nosso percurso. — Acho que você não é a única aqui começando a ficar um pouco tenso com essa história de casamento. Mas, para a sorte da sua mente curiosa, o que você me falou agora me fez pensar em algumas coisas e devo dizer que... Eu tenho duas notícias, uma boa e uma ruim. Qual você quer primeiro?

Notícia ruim. Era só o que me faltava, o mundo me dar uma rasteira e Harry Styles decidir me dar um pé na bunda a exatos três dias do nosso casamento. Deve ser a hora realmente de eu pagar pelos meus pecados.

— A ruim. — Respondi, já ensaiando o discurso de “você não pode fazer isso comigo” na minha cabeça.
— Bom, a ruim é que... A gente já está chegando no estádio, logo não vai dar para pararmos o carro em qualquer cantinho mais escondido e termos o famoso sexo reconciliador depois de uma conversa estúpida...

Viu?

Era o olhar “quero transar” mesmo.

Sigo sendo trouxa na vida. Mas sou uma trouxa ainda noiva.

— E a boa, palhaço? — Perguntei, dando-lhe a língua.
— A boa é que você é muito boa dando nó, sabia? Eu sigo sendo cega e estupidamente apaixonado por você...

Como ele poderia querer que eu não me derretesse ao ouvir isso?

Não ousei fazer nada além de deslizar os dedos suavemente pelo cabelo dele, observando aquele branquelo sem graça que vinha colorindo meu coração dia após dia. Naquele momento, me desliguei completamente dos problemas externos e tentei visualizar nós dois no dia do casamento. Dentro da minha cabeça sonhadora, felizmente, parecia não haver problema, parecia não haver impasse.

Então, por que nesse supervalorizado “mundo real”, parecia que havia?

Harry me trazia uma paz de espírito tão única, que me fazia pensar que todos os acontecimentos anteriores haviam sido devaneios da minha cabeça, me dando a vontade de grudar nele e não soltar nunca mais. Ou melhor... Me dava vontade realmente de aceitar a tal proposta de encostarmos em qualquer canto mais escondido e rolar o famoso sexo pós “eu sou cega e estupidamente apaixonado por você”. Aquele rapazinho sagaz era muito bom com as palavras mesmo!


***

Eu definitivamente tinha me esquecido de como era fazer programas em que Harry e eu não pudéssemos ficar nos beijando na maior parte do tempo e isso fez uma falta maior do que eu pensara.

Deixando todas as minhas neuras guardadas e abandonadas em um cantinho qualquer do meu cérebro, a única coisa que ficara martelando na minha cabeça, durante todo o tempo que estivéramos fora de casa, era o que ele havia dito para mim, minutos antes de chegarmos ao estádio. 

Em outras palavras, sim, nós bem que podíamos parar em um cantinho qualquer e curtir um pouco da sensação ilusória de privacidade para nos concentrarmos em outras coisas. Coisas bem proveitosas, diga-se de passagem.

Mas Harry parecera entrar mesmo no clima de torcida e tomou todo o caminho de volta para casa, incluindo a pausa que fizemos para jantar, discutindo comigo sobre o jogo. Eu, obviamente, não escutava uma palavra sequer do que ele dizia, somente acompanhava o movimento de seus lábios se abrindo e se encostando novamente a cada nova articulação que ele fazia.

É claro que eu adorava esportes, adorava beber cada mísera frase do meu adorável noivo, mas eu estava bastante dispersa aquela noite. Isso desde que saímos de casa, eu preciso admitir. Porém, se ele havia me dado algo melhor para focar meus pensamentos, eu realmente não tinha propriedades para ir contra isso.

Quando Harry, enfim, estacionou o carro na garagem da nossa casa, desligando o motor, um letreiro enorme piscou dentro da minha cabeça, gritando que a espera havia acabado e aquela era a hora perfeita.

Rapidamente, antes que ele ousasse fazer qualquer menção em abrir a porta ao seu lado, joguei meu corpo sobre o dele, segurando firmemente sua nuca e roubando-lhe o beijo mais agressivo e desesperado que ousara perpassar pela nossa vidinha de noivos nos últimos dias, com visita em casa.

Obviamente, eu estava louca. Mas eu estivera louca desde o começo daquele dia tortuoso. Agora, pelo menos, eu era uma louca que estava aproveitando um pouco dos pequenos prazeres da vida.

E, quanto à promessa que havia feito a mim mesma, sobre a suposta greve de pegação e até mesmo sexo propriamente dito, bom, eu estava, realmente, pensando quanto a isso. Eu já havia feito tanta coisa errada ultimamente, que ceder àquilo não podia fazer mal. O meu orgulho iria ter que lidar com essa.

Assim que afastei milimetricamente minha boca da de Harry apenas para poder morder – nem um pouco suavemente – seu lábio inferior, ele soltou uma risadinha quase inaudível e firmou as mãos na minha cintura, transpondo todo o meu peso que ainda estava no banco do carona para cima de si. Eu não poderia me aproveitar melhor aquela situação, era como “fazer coisa errada no colegial” de novo.

Desci meus lábios até seu pescoço, me embriagando com aquele perfume maravilhoso. Eu estava tão fora de mim que lhe dei o prazer de me ouvir gemer sutilmente sem razão aparente. Mas, enquanto eu infiltrava minhas mãos pela sua camisa, sentindo o tato da sua pele quente, eu tinha certeza de saber exatamente o motivo pelo qual eu já estava quase começando a pegar fogo.

Mas...

— (Seu nome)  miou ele, respirando de forma profunda.
— O quê?  Me afastei milimetricamente, sem retirar minhas mãos do lugar onde elas estavam.
— A gente tem que ir lá para dentro...

Harry não parecia nem um pouco seguro no que dizia querer e, para falar a verdade, o fato de estar olhando insistentemente para os meus peitos, enquanto o fazia, não lhe dava muito mais credibilidade. Eu até poderia ser boa e dar o desconto de fingir que não percebia sua vulnerabilidade naquele momento, mas meu corpo falava por mim mais rápido do que eu mesma poderia e, aproveitando-me da situação  admito , comecei a mover devagar o meu quadril sobre o seu colo.

— É? Tem certeza? — Mudei drasticamente o tom de voz para incrementar o meu ataque final. — Por quê?
— Eu não sei... — Ele murmurou, choramingando, de forma tão inaudível que, por um segundo, eu mesma achei que tivesse inventando aquilo para inflar o meu ego. Depois, contudo, seu tom também se alterou. — Bem, porque todo mundo já sabe que a gente chegou e ia ficar meio desagradável essa situação, né?
— Harry, como eles sabem que a gente chegou, se a gente tá aqui, em um espaço completamente isolado do resto da casa?

Houve um minuto de silêncio, enquanto Harry desviava os olhos para longe parecendo completamente alheio a nossa conversa. Rapidamente, porém, ele voltou a si.

— Porque... — Um suspiro preencheu sua fala. — Bem, porque, dá para ouvir o som do carro na garagem!
— E daí? Desde quando isso é problema? — Eu ri, ainda sem conseguir me desligar das minhas vontades. — Todo mundo sabe que a gente vai casar daqui a pouco e, até onde eu mesma sei, acho que não tem nada mais normal para um casal do que isso...
— (Seu nome)! — Era uma repreensão.

Não precisou de muito para que eu ficasse indescritivelmente frustrada.

Tentei não fazer uma cara feia enquanto saia lentamente de cima dele, retornando ao meu lado. Importante pontuar como falhei miseravelmente e, em pouco mais de meio minuto, eu já estava praticamente de braços cruzados e uma expressão muito eloquente no rosto. Havia uma época da minha vida na que eu conseguia ser mil vezes mais sutil do que o presente momento. Claramente tudo isso ficou para trás...

Quase ignorando a existência de Harry ao meu lado — involuntariamente, eu juro —, ajeitei minha roupa que se amarrotara no corpo e retirei o cinto. Eu conseguia aceitar, bem no fundo da minha mente, que havia um rapaz de aparência bonita me fitando, possivelmente chateado. Mas o meu orgulho havia sido rudemente dilacerado, junto com minhas necessidades físicas.

Ele merecia essa!

— (Seu nome)... — Murmurou, pronto para contornar a situação. — Não fica assim, vai. Por favor.
— Eu estou normal — ok, até eu mesma fiquei com vontade de rir depois dessa. Eu estava descaradamente agindo como criança, mas era muito mais forte do que eu.
— Até parece. E esse bico todo é o quê, posso saber? — Ele imitou minha expressão de forma muito pouco realista. — Você deveria parar de ser boba e saber que nada no mundo me deixaria mais satisfeito do que isso que você pareceu propor.
— Satisfeito? — Minha sobrancelha se arqueou, diante daquele termo bem bosta. — Só isso?
— É forma de falar. Para de fingir que não me conhece, por favor. Agora, vamos logo lá para cima, antes que eu mude de ideia. — Ele pareceu pensativo por um momento. — De qualquer forma, se você ainda estiver no clima mais tarde...

Respirei fundo, soltando o ar de forma pesada só para trazer certo drama à situação. Na verdade, a frustração e a birra já haviam passado, agora era só teatro mesmo, mas eu estava disposta a deixar isso para lá de qualquer forma. Recompondo-me, abri a porta ao meu lado e sai do carro, esperando Harry do lado de fora.

Sim, eu realmente iria deixar a sua sugestão sem o meu sonoro “não”.

— Vem cá... — sua voz ecoou pelo ambiente quando ele se pôs para fora do veículo também.

Harry contornou meu carro, correndo até mim. Segurei o sorriso ao ver seus passos rápidos, tentando não perder minha pose, apesar de achar quase tudo o que ele fazia bem adorável. Eu precisava manter minha integridade firme e forte como parte de mim.

Pena que eu estava simplesmente pouco me importando com tudo isso...

Assim que ele ficou mais próximo, abri meus braços, pronta para receber o mais apertado dos abraços e foi exatamente assim que ele o fez. Pressionando seus músculos de encontro ao meu tronco frágil, Harry me tirou do chão, fazendo-me rodopiar no ar, enquanto eu ria próximo ao seu ouvido. Mais uma vez, estava eu cedendo aos seus encantos enquanto ele me beijava o rosto várias vezes, fazendo com que cada parte da minha pele, tocada por seus lábios, formigasse um pouco.

— Ah, menina, se você soubesse os sacrifícios que eu faço para te ver feliz — falou, fazendo com que eu encostasse os pés novamente no chão.
— Do que você está falando? – Minha expressão se transformou em um enorme ponto de interrogação.

Harry não me respondeu. Ao invés disso, segurou minha mão e seguiu caminhando até a entrada da casa, tendo-me bem atrás de si e ignorando o desespero que sua frase mal colocada havia me causado.

Era oficial, eu estava em estado de alerta. Das duas, uma. Ou ele estava se sacrificando absurdos, inclusive a sua própria felicidade, para me deixar satisfeita  o que só podia significar que não, ele não queria se casar comigo, é claro. Ou ele estava aprontando alguma coisa pelas minhas costas.

Talvez fosse otimismo e até presunção da minha parte, mas alguma coisa me dizia (na verdade, alguma coisa me estapeava o rosto) que a segunda opção parecia fazer muito mais sentido. Não sei se era devido ao longo tempo de convivência, mas Harry sempre ficava imerso em um clima muito característico de cada situação. Dava para decifrá-lo muito facilmente só de observar sua forma de se portar ao longo do dia. E aquele não era uma exceção.

Pelo menos, era o que eu achava. Meu conhecimento ao meu noivo estava sendo posto à prova.

Ainda assim, ignorei essa questão logo que cheguei à sala de estar da minha queridíssima casa e avistei-o. Lá estava a coisa mais linda que eu já vira na vida. Em um segundo, eu senti tudo aquilo de novo: o calor, seu toque macio, a capacidade de me roubar só para si em questão de segundos. Eu posso jurar que meu coração batia mil vezes mais forte ao ver aquele sofá, depois de ter ficado tanto tempo fora. Ele era a personificação do conforto que eu merecia.

Mas Harry fora mais rápido do que eu.

— (Seu nome), você pode pôr a chave do carro de volta na cozinha? — Pediu, ao passar por mim.

Justin  que também estava na sala, mas fora rudemente ignorado devido à presença de um móvel tão belo e confortável como o meu sofá  olhou para a situação com certo ar de riso. Meu lado agressivo deu sinais de quem iria aflorar, mas me contive rápida e sutilmente.

— Não. — Falei como se fosse totalmente óbvio, porque, de fato, era. — Larga isso em qualquer lugar, depois a gente guarda.
— (Seu nome), deixa de ser preguiçosa! — Sim, ele estava me repreendendo pela segunda vez em menos de meia hora. Não era o meu dia de sorte. — Da última vez que você veio com esse papo de “deixa em qualquer lugar”, você perdeu a chave do seu carro para nunca mais achar. Vai lá, por favor...

Dentro de mim, mil grunhidos diferentes vieram à tona. Eu me sentia uma leoa que acabara de ser provocada por um reles humano. Aquilo não ia ficar assim mesmo. Ou talvez ficasse. Eu era uma leoa muito cansada para fazer outra coisa que não fosse me dirigir o mais rápido possível para a cozinha, largar a chave no lugar dela e correr de volta para a sala, onde eu poderia, enfim, relaxar.

Mas o plano não saiu bem como eu esperava.

Assim que pus meus pés na cozinha, fui tomada por um choque que há muito tempo eu não sentia. Parecia que meus olhos estavam completamente insanos e inventando uma realidade paralela para acabar comigo. Eu não conseguia acreditar que aquilo estava realmente acontecendo e, se estivesse, eu já conseguia sentir o meu emocional ficando ainda mais frágil do que se encontrara ultimamente. 

Quis gritar, mas não havia palavrão no mundo que pudesse expressar o que eu estava sentindo.

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Amores da minha vida, capítulo 30 com muito amor do fundo do meu coração para vocês!
Espero que vocês gostem e, por favorrr, me desculpem a demore, mas olha... Essa famigerada vida está muito abusada e complicada. Vamos mandar ela maneirar um pouco!
O capítulo 31 já tá todo montadinho... Na minha cabeça. Hahahaha
Vamos torcer para que logo, logo, ele possa estar montadinho aqui no blog também.

Um beijo e eu amo(!) vocês!